O mundo foi surpreendido esta
semana com o anúncio da renúncia do Papa Bento XVI.
A princípio, o motivo alegado
teria sido a idade avançada, problemas de saúde e simplesmente a debilidade física
do religioso. Com o passar dos dias, notícias e boatos sobre intrigas, divisões
e escândalos dentro do Vaticano foram circulando pelos órgãos de imprensa e atônitos,
vemos que se trava verdadeira guerra no mundo Católico. O próprio Papa
surpreendeu novamente ao falar abertamente sobre a existência de “Divisões do
corpo eclesiástico”, que , segundo ele, “ desfiguram a face da Igreja” e põe em
perigo “sua unidade” e conclamou todos a “superar o individualismo e as
rivalidades”.
Estranho discurso de um Papa que
em seu pontificado nomeou 67 dos 120 cardeais eleitores que apresentarão seu
voto sob os afrescos da Capela Sistina no próximo mês. Portanto, apesar do papado
de Bento XVI ter durado um quarto do de João Paulo II, ele possui
significativamente mais aliados que seu antecessor no Vaticano. Ele foi muito
criticado por promover com freqüência cardeais conservadores com um viés pró-europeu,
apesar do fato de a maioria absoluta dos católicos no mundo viver em países em
desenvolvimento.
Fora da Europa, Bento XVI
favoreceu conservadores contra tradicionais posições liberais, tais como
homossexualidade, contracepção, aborto e secularização.
John Allen, um analista do
Vaticano, escreveu num artigo na terça-feira passada no “National Catholic Repórter”:
“pelo menos alguns cardeais podem se sentir fortemente pressionados a não fazer
algo que possa ser percebido como um repúdio ao papado de Bento XVI, ou que
possa causar consternação a ele”.
Eu concluo, portanto, que a renúncia
de Bento XVI já vinha sendo articulada há muito tempo.
Em março de 2012, em meio ás suas
férias em Castelgandolfo, Joseph Ratzinger mergulhou num poço obscuro que só
seus olhos estavam autorizados a ver: um documento, elaborado por três cardeais
octogenários, sobre o sumiço de inúmeros documentos secretos que abaloou o
Vaticano, e cujo tremor só cessou após a prisão de Paolo Gabriele, mordomo de Bento
XVI.
Some-se a isso: Cardeais brigados
entre si, instituições religiosas competindo por privilégios, um secretário de Estado,
Tarcisio Bertone, que há muito tempo perdeu a confiança do Papa que, para
evitar o escândalo da sua substituição decidiu substituir a si próprio.
Em Setembro de 2009, Ratzinger
nomeou o financista Ettore Gotti Tedeschi, ligado ao Opus Dei representante do
Banco Santander na Itália desde 1992, presidente do Instituto para Obras de
religião (IOR), o chamado Banco do Vaticano. Tedeschi chegou ao Banco do Vaticano
com a intenção de limpá-lo, mas antes de completarem três anos ele se deu conta
de que aquele trabalho era, efetivamente, muito perigoso. Tanto que na
Primavera de 2012, Tedeschi redigiu um informe secreto de tudo o que vira nos
meses anteriores. Foi descobrindo que, atrás de algumas contas cifradas,
escondia-se dinheiro sujo de políticos, intermediários, construtores e altos
funcionários do Estado. Mas não só. Como sustenta o Fisco de Trapani (Sicília),
Também Matteo Messina Denaro, chefão da Cosa Nostra, teria colocado sua fortuna
no IOR em nome de laranjas.
É esse o Vaticano que Ratzinger
abandona.
Mais ainda: Vítimas dizem que
Pontífice pouco fez para pôr fim a abusos sexuais.
Foram constatados pela promotoria
de Justiça do Vaticano cerca de 4.000 casos de abusos causados por padres católicos
em todo o mundo, na última década. 60% dos acusados tiveram sanções leves por
conta da idade avançada. A Igreja católica teve que pagar mais de US$ 1 bilhões
em forma de indenizações, de 2003
a 2009, por 375 casos denunciados.
Entre 2004 e 2011, oito dioceses
declararam falência por não conseguir cobrir os compromissos com a justiça.
Nesses escândalos todos, tivemos
notícia de apenas UM condenado: O Arcebispo Edgardo Storni, que foi condenado a
oito anos de prisão, em Santa
Fé (Espanha).
O escândalo que teve maiores
proporções aconteceu em Boston (EUA), em 2002, quando foi descoberto que
autoridades eclesiásticas encobriam os crimes e apenas trocavam os padres
envolvidos de diocese, sem expulsá-los da igreja nem denunciá-los. Em 2007 a Igreja já havia gasto
mais de US$ 600 milhões em acordos com as famílias das crianças. E, na semana
passada, o “Los Angeles Times” denunciou que parte dessa verba (US$ 15 milhões)
v eio de um fundo destinado à manutenção de cemitérios, sustentado pelas famílias
dos mortos.
Caso parecido, de acobertamento
dos casos de pedofilia aconteceu na Irlanda e resultou num colapso nas relações
diplomáticas entre Dublin e o Vaticano.
Isso tudo sem contar que um
tribunal da Argentina denunciou a cumplicidade da Igreja Católica com os
militares que governaram o país entre 1976 e 1983.
Detalhe: Roger Mahony, cardeal
que acobertou, por 25 anos, o abuso sexual a mais de 500 meninos na região de
sua arquidiocese, já está de malas prontas para participar do Conclave no vaticano,
ignorando a objeção da opinião pública ao seu nome.