Minha primeira experiência no maracanã foi aos 10 anos de idade e foi ali que eu realmente me tornei um tricolor!
Éramos muito pobres e meu pai trabalhava incessantemente, de segunda a sábado em seu emprego de Carpinteiro e aos domingos invariavelmente ele tinha algum biscate para fazer, complementando assim a renda mensal.
Era como se fosse uma experiência religiosa: Eu e meu pai acabávamos de tomar o café da tarde e ficávamos sentados no sofá da sala. O rádio, um Phillips de 4 pilhas grandes ligado em cima da mesa de centro, como se fosse a televisão que não possuíamos era ligado num volume alto, para não perdermos nenhum lance. Eu adorava aquilo, principalmente porque tinha poucos momentos juntos a meu pai, coitado, que vivia sempre ocupado trabalhando. Eu imaginava os lances, acompanhava a tudo com a maior atenção e pulava junto do goleiro Félix, para fazer uma defesa espetacular, ou roubava a bola do adversário com a calma e a tranqüilidade de Denílson, o “Rei Zulu”. Vibrava com os golaços de Flávio, o “Minuano”, e me divertia com os dribles imprevisíveis do ponta-direita Cafuringa!
Certo dia, meu pai me avisou que iríamos ao Maracanã ver o Fla-Flu. Eu me recordo que fui sem saber que era a decisão do campeonato carioca, só sabia que iria no Maracanã e que era algo que eu nunca tinha imaginado na minha vida! Eu era só expectativa, porque naqueles tempos duríssimos, era raro um passeio que não fosse à Quinta da Boa Vista ou à praia, divertimentos gratuitos.
Quando lá chegamos, fiquei boquiaberto! Havia muita gente indo pra lá e pra cá, cada uma mais apressada que a outra. Meu pai segurava minha mão com uma força maior que normalmente usava, e a todo momento me recordava para não me afastar dele. Meu coração batia descompassado e fui entrando, sem querer, na mesma excitação que unia a todos naquele momento. Meu pai comprou as entradas, sempre me carregando pra lá e pra cá e eu apenas seguia, como ele queria. Entramos por uma espécie de túnel e quando saímos do outro lado, tive a visão encantada do gramado do maracanã! O estádio era enorme, gigantesco e estava completamente abarrotado. Tivemos sorte de encontrar um lugarzinho para dois, apertando aqui e e ali e ficamos eu e meu pai, praticamente sem nos falar, pois logo em seguida o Fluminense entrou em campo. Uma multidão gritando e cantando, agitando enormes bandeiras coloridas, jogando pó-de-arroz, e soltando bolas de gás. Era muita alegria para meu pequeno coração. Eu olhava a tudo, sem querer perder nenhum detalhe, os olhos girando pra lá e pra cá, querendo saber todos os detalhes, todos os movimentos dentro e fora do campo.
Me lembro que antes da partida ser iniciada, soltaram vários pombos que voaram em círculos cada vez maiores, como se tivessem ensaiado durante toda a semana para essa cerimônia em especial. Balões foram soltos e cada torcida vibrava quando o seu balão conseguia escapar do estádio e voar livre, pelo Rio de Janeiro.
Quando a partida começou, iniciou-se também o meu sofrimento. O Flamengo partiu pra cima do Fluminense e não dava um minuto de descanso. Uma ou duas vezes o Flamengo esteve a ponto de marcar, mas o grande goleiro Félix salvou-nos por pouco. De repente, gol do Fluminense! Uma bola rebatida pelo goleiro Domingues do Flamengo sobrou pelo lado esquerdo. Lula, nosso ponta-esquerda tentou fazer o gol, dando um chute que passou rasteirinho a centímetros da linha de gol e acabou do lado oposto onde vinha entrando o ponta-direita Wilton que sem ângulo, conseguiu meter a bola dentro do gol! Eu e meu pai pulamos, gritamos e demoramos a nos sentar novamente. No entanto, a pressão do Flamengo não diminuía, e nosso sofrimento aumentava. Faltando dez minutos para terminar o primeiro tempo, o meio campista do Flamengo, Liminha, acertou um “canhão” pelo alto, de longe, empatando a partida.
Na nossa frente estava uma menina, adolescente, torcedora do flamengo, que começou a me encarnar, jogando pipocas do saco que ela estava comendo em mim, dizendo que o Flamengo iria ser campeão, porque o Flamengo era melhor, porque o Fluminense era fraquinho... aquilo mexeu com meus brios! Fechei a cara e passei a gritar mais alto quando o jogo recomeçou e pra minha surpresa, logo em seguida, o Fluminense desempatou a partida, com um gol de Cláudio. Melhor ainda: o goleiro do Flamengo reclamou com o juiz e acabou expulso, ficando o Flamengo com um jogador a menos. Devolvi todas as encarnações para a flamenguista à minha frente que, abusada, ainda devolvia minhas gozações dizendo que o Flamengo seria campeão, porque bastava empatar. Aquilo era uma surpresa pra mim. Era uma decisão? Quem ganhasse seria campeão? Se o jogo terminasse empatado o Flamengo era campeão? Perguntei tudo de uma só vez ao meu pai que confirmou cada uma das perguntas, me deixando um tanto confuso, mas aí o jogo de futebol transcendeu sua importância, tornando-se vital para mim. Era questão de honra o Fluminense ser campeão! A garota não parava de me infernizar, cantando a toda hora que o Flamengo seria campeão. E de fato, em campo, o Flamengo pareceu crescer ainda mais, dando a nítida impressão que era o Fluminense que estava com um jogador a menos! Mentalmente eu xingava a garota e a todos os flamenguistas da face da terra e torcia desesperadamente para que o jogo terminasse logo e o Fluminense fosse o campeão.
Segundo tempo iniciado e o panorama continuava o mesmo: só dava Flamengo e a menina ali, me azucrinando. Ela deve ter percebido que eu estava fervendo de raiva e isso era um incentivo a mais para me caçoar. Por volta dos quinze minutos, o que estava se desenhando aconteceu: Gol do Flamengo. Dionísio, de cabeça! Parecia que o mundo ia se acabar. Parecia que naquele maracanã só tinha torcedor do Flamengo. Senti cada grito dirigido a mim somente, como se os mais de cento e setenta mil torcedores presentes gritassem diretamente nos meus ouvidos. Meu rosto ficou roxo de fúria, e a tal garota não parava de me encher o saco! Dali por diante, eu quase não via nada, porque todos os presentes estavam de pé, alucinados com uma das partidas de futebol mais emocionantes de todos os tempos. Era tanta gente que meu pai, preocupado, resolveu sair do estádio antes do término da partida. Caminhamos por umas ruas largas, a procura de uma condução que nos levasse pra casa, quando repentinamente um grito de gol se fez ouvir. Meu pai não tinha radio pequeno de pilha, e então ficamos sem saber quem tinha feito gol, mas meu coração ficou mais apertado. Tinha certeza que era gol do Flamengo, porque o Fluminense estava virtualmente derrotado, apenas se defendendo enquanto o Flamengo massacrava nosso time. Finalmente entramos num ônibus, superlotado, e ainda ferreamente seguro pela mão do meu pai, consegui me ajeitar num cantinho mais ou menos protegido ao lado de um cara que estava ouvindo o jogo por um radinho de pilha. Eu não tinha coragem de perguntar quem tinha feito o gol e nem conseguia entender nada do que se falava no rádio. Uma confusão danada, uma gritaria, com muita gente do lado de fora gritando “É campeão! É Campeão!” e a angústia crescendo no meu peito até que alguém gritou: “Flusão Campeão!”
Não me lembro de mais nada daquele minuto em diante, até a volta pra minha casa. A única coisa que eu pensava era naquela garota, flamenguista. “Toma, papuda!” era o que eu queria dizer na cara dela! Me senti vingado! Feliz como nunca antes na minha vida, sem saber que anos depois, eu me apaixonaria e casaria com uma garota flamenguista!
Éramos muito pobres e meu pai trabalhava incessantemente, de segunda a sábado em seu emprego de Carpinteiro e aos domingos invariavelmente ele tinha algum biscate para fazer, complementando assim a renda mensal.
Era como se fosse uma experiência religiosa: Eu e meu pai acabávamos de tomar o café da tarde e ficávamos sentados no sofá da sala. O rádio, um Phillips de 4 pilhas grandes ligado em cima da mesa de centro, como se fosse a televisão que não possuíamos era ligado num volume alto, para não perdermos nenhum lance. Eu adorava aquilo, principalmente porque tinha poucos momentos juntos a meu pai, coitado, que vivia sempre ocupado trabalhando. Eu imaginava os lances, acompanhava a tudo com a maior atenção e pulava junto do goleiro Félix, para fazer uma defesa espetacular, ou roubava a bola do adversário com a calma e a tranqüilidade de Denílson, o “Rei Zulu”. Vibrava com os golaços de Flávio, o “Minuano”, e me divertia com os dribles imprevisíveis do ponta-direita Cafuringa!
Certo dia, meu pai me avisou que iríamos ao Maracanã ver o Fla-Flu. Eu me recordo que fui sem saber que era a decisão do campeonato carioca, só sabia que iria no Maracanã e que era algo que eu nunca tinha imaginado na minha vida! Eu era só expectativa, porque naqueles tempos duríssimos, era raro um passeio que não fosse à Quinta da Boa Vista ou à praia, divertimentos gratuitos.
Quando lá chegamos, fiquei boquiaberto! Havia muita gente indo pra lá e pra cá, cada uma mais apressada que a outra. Meu pai segurava minha mão com uma força maior que normalmente usava, e a todo momento me recordava para não me afastar dele. Meu coração batia descompassado e fui entrando, sem querer, na mesma excitação que unia a todos naquele momento. Meu pai comprou as entradas, sempre me carregando pra lá e pra cá e eu apenas seguia, como ele queria. Entramos por uma espécie de túnel e quando saímos do outro lado, tive a visão encantada do gramado do maracanã! O estádio era enorme, gigantesco e estava completamente abarrotado. Tivemos sorte de encontrar um lugarzinho para dois, apertando aqui e e ali e ficamos eu e meu pai, praticamente sem nos falar, pois logo em seguida o Fluminense entrou em campo. Uma multidão gritando e cantando, agitando enormes bandeiras coloridas, jogando pó-de-arroz, e soltando bolas de gás. Era muita alegria para meu pequeno coração. Eu olhava a tudo, sem querer perder nenhum detalhe, os olhos girando pra lá e pra cá, querendo saber todos os detalhes, todos os movimentos dentro e fora do campo.
Me lembro que antes da partida ser iniciada, soltaram vários pombos que voaram em círculos cada vez maiores, como se tivessem ensaiado durante toda a semana para essa cerimônia em especial. Balões foram soltos e cada torcida vibrava quando o seu balão conseguia escapar do estádio e voar livre, pelo Rio de Janeiro.
Quando a partida começou, iniciou-se também o meu sofrimento. O Flamengo partiu pra cima do Fluminense e não dava um minuto de descanso. Uma ou duas vezes o Flamengo esteve a ponto de marcar, mas o grande goleiro Félix salvou-nos por pouco. De repente, gol do Fluminense! Uma bola rebatida pelo goleiro Domingues do Flamengo sobrou pelo lado esquerdo. Lula, nosso ponta-esquerda tentou fazer o gol, dando um chute que passou rasteirinho a centímetros da linha de gol e acabou do lado oposto onde vinha entrando o ponta-direita Wilton que sem ângulo, conseguiu meter a bola dentro do gol! Eu e meu pai pulamos, gritamos e demoramos a nos sentar novamente. No entanto, a pressão do Flamengo não diminuía, e nosso sofrimento aumentava. Faltando dez minutos para terminar o primeiro tempo, o meio campista do Flamengo, Liminha, acertou um “canhão” pelo alto, de longe, empatando a partida.
Na nossa frente estava uma menina, adolescente, torcedora do flamengo, que começou a me encarnar, jogando pipocas do saco que ela estava comendo em mim, dizendo que o Flamengo iria ser campeão, porque o Flamengo era melhor, porque o Fluminense era fraquinho... aquilo mexeu com meus brios! Fechei a cara e passei a gritar mais alto quando o jogo recomeçou e pra minha surpresa, logo em seguida, o Fluminense desempatou a partida, com um gol de Cláudio. Melhor ainda: o goleiro do Flamengo reclamou com o juiz e acabou expulso, ficando o Flamengo com um jogador a menos. Devolvi todas as encarnações para a flamenguista à minha frente que, abusada, ainda devolvia minhas gozações dizendo que o Flamengo seria campeão, porque bastava empatar. Aquilo era uma surpresa pra mim. Era uma decisão? Quem ganhasse seria campeão? Se o jogo terminasse empatado o Flamengo era campeão? Perguntei tudo de uma só vez ao meu pai que confirmou cada uma das perguntas, me deixando um tanto confuso, mas aí o jogo de futebol transcendeu sua importância, tornando-se vital para mim. Era questão de honra o Fluminense ser campeão! A garota não parava de me infernizar, cantando a toda hora que o Flamengo seria campeão. E de fato, em campo, o Flamengo pareceu crescer ainda mais, dando a nítida impressão que era o Fluminense que estava com um jogador a menos! Mentalmente eu xingava a garota e a todos os flamenguistas da face da terra e torcia desesperadamente para que o jogo terminasse logo e o Fluminense fosse o campeão.
Segundo tempo iniciado e o panorama continuava o mesmo: só dava Flamengo e a menina ali, me azucrinando. Ela deve ter percebido que eu estava fervendo de raiva e isso era um incentivo a mais para me caçoar. Por volta dos quinze minutos, o que estava se desenhando aconteceu: Gol do Flamengo. Dionísio, de cabeça! Parecia que o mundo ia se acabar. Parecia que naquele maracanã só tinha torcedor do Flamengo. Senti cada grito dirigido a mim somente, como se os mais de cento e setenta mil torcedores presentes gritassem diretamente nos meus ouvidos. Meu rosto ficou roxo de fúria, e a tal garota não parava de me encher o saco! Dali por diante, eu quase não via nada, porque todos os presentes estavam de pé, alucinados com uma das partidas de futebol mais emocionantes de todos os tempos. Era tanta gente que meu pai, preocupado, resolveu sair do estádio antes do término da partida. Caminhamos por umas ruas largas, a procura de uma condução que nos levasse pra casa, quando repentinamente um grito de gol se fez ouvir. Meu pai não tinha radio pequeno de pilha, e então ficamos sem saber quem tinha feito gol, mas meu coração ficou mais apertado. Tinha certeza que era gol do Flamengo, porque o Fluminense estava virtualmente derrotado, apenas se defendendo enquanto o Flamengo massacrava nosso time. Finalmente entramos num ônibus, superlotado, e ainda ferreamente seguro pela mão do meu pai, consegui me ajeitar num cantinho mais ou menos protegido ao lado de um cara que estava ouvindo o jogo por um radinho de pilha. Eu não tinha coragem de perguntar quem tinha feito o gol e nem conseguia entender nada do que se falava no rádio. Uma confusão danada, uma gritaria, com muita gente do lado de fora gritando “É campeão! É Campeão!” e a angústia crescendo no meu peito até que alguém gritou: “Flusão Campeão!”
Não me lembro de mais nada daquele minuto em diante, até a volta pra minha casa. A única coisa que eu pensava era naquela garota, flamenguista. “Toma, papuda!” era o que eu queria dizer na cara dela! Me senti vingado! Feliz como nunca antes na minha vida, sem saber que anos depois, eu me apaixonaria e casaria com uma garota flamenguista!
Nenhum comentário:
Postar um comentário